Literatura

Passarinha, Kathryn Erskine

O que dizer de um livro que te afetou por diversos motivos e ainda assim você não sabe o que falar sobre?
passarinha

Caitlin é uma garotinha especial: portadora da Síndrome de Asperger, ela vê as coisas de uma forma bem única, preto e branco, de forma literal e objetiva. Antes ela tinha seu irmão Devon para explicar as coisas que Caitlin não entendia, mas depois d’O Dia Em Que Sua Vida Desmoronou tudo ficou diferente. Seu pai chora com frequência e ela não sabe exatamente o que fazer para que tudo volte ao normal. Quando a menina descobre a palavra “desfecho”, percebe que é exatamente isso que eles precisam, e ela está determinada a encontrar o desfecho necessário para que eles finalmente possam seguir em frente.

Minha relação e curiosidade acerca de Passarinha tem uma natureza bem pessoal: tenho um irmão autista. Há cerca de 8 anos me pergunto sobre o que se passa na cabeça dele, a razão pela qual ele faz as coisas que faz, esse tipo de coisa. Não esperava conseguir respostas no livro de Kathryn Erskine, e sim uma trama que entendia do que se tratava e se utilizava dessa protagonista diferente de forma inteligente. Foi exatamente o que encontrei, junto com algumas lágrimas e diversos sentimentos.

“Às vezes eu leio os mesmos livros uma vez atrás da outra. O bom dos livros é que as coisas do lado de dentro não mudam. As pessoas dizem que não pode julgar um livro pela capa mas isso não é verdade porque a capa diz exatamente o que tem dentro. E não importa quantas vezes você leia aquele livro as palavras e imagens não mudam. Você pode abrir e fechar os livros um milhão de vezes que eles continuam os mesmo. Têm a mesma aparência. Dizem as mesmas palavras. Os gráficos e ilustrações são das mesmas cores.

Livros não são como pessoas. Livros são seguros.”

Cuidado é essencial em qualquer livro, mas principalmente numa história como essa. Felizmente a autora consegue transmitir com competência a forma que Caitlin pensa e percebe o mundo. Os dramas são plausíveis e compreensíveis, e é praticamente impossível não se solidarizar com aqueles indivíduos e sua jornada com tanta coisa ruim que precisaram enfrentar – e você passa por muita coisa junto com eles. Me vi desesperada, triste, alegre, triste de novo, mais alegre e me peguei chorando por qualquer coisa nas últimas páginas. Não que seja difícil me fazer chorar, mas Kathryn mexeu com meu emocional mesmo.

Acompanhamos Caitlin em sua missão em busca do desfecho e suas tentativas de se conectar com as pessoas a seu redor. E sentimos tudo o que ela sente no caminho, principalmente seu desespero ou frustração e é fácil sorrir com a garotinha e sua história. A escrita é doce e parece muito simples num primeiro momento, mas é montada com bastante cuidado, o que torna a leitura ainda mais especial. As lições que a protagonista aprende ao longo da trama são tocantes, praticamente um poço de empatia mesmo. Além disso, Passarinha faz o leitor pensar em vários assuntos e trata de questões bem relevantes durante a narrativa, e a moral de sua obra é uma coisa linda – nunca vi alguém dizer “não seja babaca” com tanta finesse, então parabéns para Kathryn.

“É muito difícil enxergar o que você tem que enfrentar quando as coisas começam a virar geleia e se fundir num borrão e se transformar umas nas outras.”

A diagramação e tradução da Editora Valentina merecem menção, também. As letras são grandes, folhas amarelas, e a tradução conseguiu transmitir a mensagem da obra com perfeição mesmo com tantos elementos “escondidos” na escrita.

No final das contas, não sei realmente o que dizer sobre Mockingbird além de: leiam. É bonito, tocante e interessante, o que significa que não é difícil ler a coisa toda em um dia só. Um livro doce e encantador que, através de sua simplicidade, dá pequenas e grandes lições sobre como ser um ser humano melhor.

“O cinzento do lado de fora também está do lado de dentro. Dentro da sala. Dentro do armário. Dentro de mim. É tão cinzento que acendendo um abajur fica forte demais e dói. Por isso os abajures estão apagados. Mas ainda assim está claro demais. Deveria ser preto por dentro e é isso que eu quero então ponho a cabeça debaixo da almofada do sofá onde o tecido xadrez verde tem o cheiro do suor de papai e das meias de Devon e das minhas pipocas e eu sinto o peso macio da almofada sobre a minha cabeça e avanço ainda mais até meus ombros e peito também poderem entrar e sinto um peso em cima de mim que me impede de flutuar e cair e flutuar e cair como o passarinho.”

informações

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Cortesia para resenha.
Título: Passarinha
Autor: Kathryn Erskine
Tradutor: Heloísa Leal
Número de Páginas: 224
Edição: 1ª – 2013
ISBN: 9788565859134
Editora: Valentina
Preço: R$29,90
Classificação: ★★★★½

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1 Comment

  • Reply
    Tarsila Martins
    14/11/2014 at 4:20 pm

    Esse livro deve ter tido uma conexão bem mais profunda com você do que teve com a maioria das pessoas que leram. Acho incrível como alguns autores conseguem entrar no mundo de pessoas como os autistas, e tratar de forma encantadora.
    Ainda não li esse livro, mas tenho muita vontade, faz muito tempo que ele está na minha lista de desejados e cada vez que leio uma resenha sobre ele, tenho mais vontade ainda de lê-lo, acho que vou adorar esse livro.
    Beijos!

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