Já ouviu falar que algumas minorias são maiores que muitas maiorias? A verdade é que as mulheres são uma dessas minorias gigantes e o feminismo existe para mostrar ao mundo que nada – NADA – pode diminuir as mulheres como seres humanos. As mulheres precisam ser representadas e é por isso que achamos importante um movimento como o feminismo na cultura pop.
O WT é uma equipe composta por 14 mulheres. Isso mesmo, QUATORZE. Cada uma, com sua particularidade, acrescenta algo importante ao site e o fato de sermos tão diferentes umas das outras nos deu uma nova noção: a validação da mulher na sociedade. Nós somos uma geração de gente tentando conscientizar o que há de mais importante nessa vida – o respeito.
Não é uma surpresa dizer que o WT é feminista.
Essa semana de Coisa de Mulherzinha está aqui para provar nosso ponto. Feminismo é mais do que uma palavra, é um ato de respeito.
“Considerando que ler se tornou uma atividade mais feminina e que os homens são mais servidos em outras médias: a web, filmes, jogos. Claro que as editoras vão focar num público mais rentável (…). Se escritores homens pudessem servir mais esse tipo de protagonista (o joven rapaz). Só seremos marginalizados se aceitarmos esse status.”
Essa é parte da resposta que Chuck Palaniuk deu quando abordado no tumblr sobre a marginalização de escritores homens na indústria editorial. Sua postura foi tão… estranha que deixou muita gente embasbacada – principalmente as mulheres escritoras, que batalham tanto e vira e mexe se deparam com o clássico “Escreve quase tão bem quanto homem.” Tal posicionamento nos faz questionar o tamanho da distorção do papel da mulher em tudo que seja ligado ao entretenimento e é assim que queremos abrir esse papo com algumas das nossas autoras, blogueiras, mulheres preferidas.
Dividimos essa matéria em duas partes e esperamos que vocês apertem os cintos para entrar nessa jornada conosco.
Who’s Thanny: Vocês sentem uma diferença de tratamento acerca de seus livros/trabalho em relação a livros escritos (ou trabalho feito) por homens? Se sim, de que forma?
Larissa: Nunca passei por nenhum preconceito escancarado por eu ser mulher. Claro que o fato de eu escrever fantasia influencia de certa forma – é um gênero considerado mais “unissex”, e em geral os leitores não se importam tanto se o autor é homem ou mulher. Mas faz diferença na hora de abordar os leitores homens, por exemplo, em uma Bienal do Livro. O fato de eu ser uma garota segurando um livro dá a eles quase que uma identificação imediata de que o conteúdo daquele livro é “de menininha”, do tipo que eles nem pegam pra olhar. É muito difícil quebrar essa barreira quando já é algo tão intrínseco à pessoa. E às vezes isso acontece com as meninas também – elas torcem o nariz para uma capa em cores mais femininas, ou julgam a possibilidade de um romance na narrativa como se aquilo impedisse o foco em outras coisas mais importantes à história. Não vejo o mesmo acontecer com os livros dos meus colegas homens.
Yasmin: Sou um pouco paranoica com as minhas coisas, mas creio que se eu disser “sim” não é mentira. (risos) No meu caso, passei por dois tipos de tratamento: de um lado, super valorizaram meu trabalho, como meus professores e boa parte das mulheres de minha família; do outro, sofri um pouco de subestimação com alguns parentes. Esses últimos sempre acharam que escrever seria uma distração ou que eu não sabia o que queria da vida. Bem, posso dizer que eles se enganaram: após o lançamento de SSD, tive mais certeza de que quero prosseguir no caminho da escrita.
Anne: Felizmente, até que não vejo muito disso. Só uma vez alguém comentou que eu acabava deixando minha narração mais emotiva do que objetiva por eu ser uma garota, mas nem levei isso muito a sério – até porque, minha especialidade realmente é o campo emotivo/psicológico, apesar de isso nada ter a ver com o argumento usado.
Denise: Por sorte e graças à marcante quantidade de autoras nesse ramo, a diferença não é tanta. Mas sim, já notei tratamento diferente com o meu livro, mesmo com a temática parecida com a de outros autores, só pelo fato de ter um A no final da palavra que denomina minha carreira. Foram pouco comentários, por sorte, mas já ouvi sobre como, por ter colocado uma garota para protagonizar o livro, acabei pendendo para o lado mais sentimental da Força (o que é bem bizarro porque todos os meus personagens são sentimentais, já que essa característica, para mim, como autora, é o que aproxima eles da realidade – e, curiosamente, entre todos, a Serafine é a mais explosiva).
Tammy: Honestamente? Não fico prestando atenção. Eu acho que hoje o mercado de entretenimento melhorou demais e vejo que as escritoras mulheres estão se destacando muito. Nunca imaginei vender tantos livros como vendo hoje e percebo que tenho leitores homens e mulheres que adoram ler um livro escrito por uma mulher. E não apenas ler a Tammy Luciano, mas vários outras autoras.
Iris: Geralmente os meninos são mais resistentes aos meus livros. E todo mundo já classifica como “livro de mulherzinha”, por ter uma capa cor de rosa e a protagonista ser uma menina. Mas fico feliz quando um menino lê e depois vem comentar comigo que foi totalmente diferente do que esperava. Eu não escrevo para meninas. Eu escrevo para todo mundo.
Mareska: Nunca tinha percebido isso antes, mas já ouvi algumas vezes que minha afinidade com o setor infantil se devia ao fato de eu ser mulher e ter instinto materno.
Renata: Quanto a minha experiência… desde de sempre fui taxada. Pensem, sou loira (natural) e magra. Quando criança era muito magra, o que me deixava com cara de mais frágil ainda. Mesmo agora adulta, com meus 35 anos, pareço uma adolescente. Em qualquer lugar que eu vá, qualquer trabalho que eu faça, sempre me menosprezam por essa aparência menininha. Se tiver outro homem junto, me sinto uma secretária que está lá somente para anotar. Só quando começo a falar é que me dão atenção. Mas, ainda ocorre pior. Tem vezes que parecem que minhas palavras não servem. Não tem validade. Daí fica aquilo de você falar, ouvirem sem muita atenção, e depois de alguns minutos, algum homem repete o que disse e é “aplaudido”. Revoltante. E quanto à literatura, percebo também que há uma crescente. Escritoras internacionais têm se destacado no geral. J.K. Rolling, Jennifer Egan, Susanne Colloins, Veronica Roth, Donna Tartt e tantas outras escritoras. Já no Brasil, tem crescido de certa forma. Principalmente nesse nicho de jovens leitores. Isso me deixa mais otimista. Já que, como nas demais profissões no país, há uma ligeira tendência em considerar mais textos de escritores (homens).
Com o lançamento de The Maze Runner, uma pergunta que Dylan O’Brien ouviu bastante foi ‘Como é ser o protagonista masculino num gênero tão dominado por protagonistas femininas como é o das distopias?’; ele se mostrou curioso pela frequência da pergunta, porque geralmente a surpresa é com as mulheres em destaque e talvez essa imagem esteja começando a mudar. E é verdade, a maioria dos livros, filmes e séries – especialmente aqueles voltados para jovens adultos e adolescentes – têm nos presenteado com personagens femininas mais fortes do que poderíamos considerar pedir. Temos certeza que cada uma de vocês tem aquela personagem que marcou seu coração. Qual a personagem – seja protagonista, seja secundária – que te fez entender que ‘espera um pouco, essa mulher/garota é mais do que as pessoas querem pensar dela’ e qual a importância que você vê esse tipo de personagem tendo na literatura/telona/telinha?
Bárbara: Eu não ia responder essa pergunta porque não conseguia escolher, mas aí voltei no túnel do tempo e lembrei da primeira de todas: a Éowyn, de Senhor dos Anéis. Senhor dos Anéis é aquela obra que tem 3 mulheres importantes na história inteira, enquanto só a sociedade do anel tem SETE HOMENS, então não é um exemplo de representatividade, mas a Éowyn tem um papel impressionante na história. Ela começa como a sobrinha do rei de Rohan e você não dá dois centavos para ela, mas ela termina matando O LÍDER DOS NAZGUL, VELHO, porque “nenhum homem pode matar o Balrog”, mas ela não é homem e GENTE COMO ELA É BADASS. Éowyn não segue esse padrão de “mulher forte” que se convencionou na cultura pop ultimamente, de mulher que mata todo mundo e não tem nenhuma fraqueza. Ela tem várias nuances e num livro povoado por homens, ser mulher acaba sendo a sua maior força. Isso é muito mais do que a gente vê por aí ultimamente.
Anne: Ai, céus, como eu posso escolher?? Vou com duas, pode ser? Primeiro, Erza Scarlet, do mangá/anime Fairy Tail. Diva, linda, poderosa, cheia de estilo, põe medo em meio mundo (em todo mundo) e faz absolutamente tudo por seus amigos. Como não se encantar? E sabe o melhor? Ela é apresentada para nós como alguém inabalável, e só depois você vai descobrindo todas as lágrimas e dores que se escondem por debaixo de sua armadura. E eu acho isso fantástico. Porque nos inspira a manter a cabeça erguida, a enfrentar nossos problemas, a seguir em frente. Aliás, esse mangá tem umas personagens femininas lindonas, cada uma sendo f*da a seu modo e por seus motivos, provando que não estão ali para brincadeira. E não posso deixar de citar Sara Crewe, do filme A Princesinha (tem um livro também, mas eu nunca o li, então me abstenho de falar sobre ele) Sabem que esse é meu filme preferido? Ganha até dos de animação (e isso não é pouco) Eu cresci o assistindo, e agradeço muito por isso. É um filme tão belo, tão permeado de magia… E o que me marcou mesmo foi uma de suas falas “Eu sou uma princesa. Todas as garotas são. Mesmo que elas vivam em pequenos e velhos sótãos. Mesmo que se vistam com trapos. Mesmo que não sejam bonitas, ou inteligentes, ou jovens. Elas ainda são princesas. Todas nós.” Eu levo isso comigo até hoje (pra não falar do quanto de amizade e família tem, e a soundtrack linda, e(céus, calem minha boca antes que eu perca o controle aqui))
Larissa: Eu tenho uma memória um pouco ruim, então não me vem nenhum nome imediato à cabeça pra citar pra vocês haha. Mas de uma forma geral, eu gosto muito daquelas personagens subestimadas, às vezes até esquecidas num canto, estereotipadas. Adoro, por exemplo, o tipinho patricinha, que a gente tão comumente associa às vilãs em livros juvenis. Sinto falta de histórias que trabalhem mais essas personagens, que as humanizem mais. Elas são mulheres também, são pessoas, tem suas forças e fraquezas. Mais importante, elas não merecem ser julgadas à partir de uma representação abstrata da sua aparência ou do seu comportamento. Na literatura juvenil de hoje, o mundo nerd tem sido tão fortalecido que parece quase errado ir contra a maré. Então qualquer personagem que quebre esses novos estereótipos me ganha e me surpreende. Acho que é preciso uma dose extra de força pra se firmar quando você tem tudo pra ser a personagem menos querida de todos os tempos. Essas rupturas ajudam a fortalecer a ideia de que nós, garotas, podemos ser quem quisermos, e isso não nos impede de nada. É um exemplo que falta a muita gente.
Iris: O mercado audiovisual para mulheres ainda é bem pequeno. As personagens femininas tem ganhado destaque, mas as atrizes mulheres mais bem pagas ainda ganham muito menos que os homens. A New York Film Academy fez uma pesquisa muito boa nesse sentido no inicio do ano sobre o mercado em Hollywood e as diferenças são alarmantes. A gente vê que as mulheres ainda tem muito espaço a conquistar no cinema – e em vários outros espaços da indústria cultural. Uma pesquisa recente mostrou que o número de mulheres ficcionistas no Brasil é muito menor que o de homens, assim como espaço que elas ganham em feiras, reconhecimento etc. Geralmente o produto feito pela mulher já é classificado como inferior ou de mulherzinha. Tem gente que sequer dá uma chance! As próprias mulheres acabam rotulando por que a gente tem uma cultura muito forte que nos diz isso o tempo inteiro. É difícil ser mulher e fazer arte, mas amo saber que muitas mulheres tem quebrado essa barreira e que o mercado está ficando cada vez mais receptivo para nós. Eu amo a Katniss Everdeen. Eu tenho muitas ressalvas com a ideia de “personagem feminina forte”, por que mulheres podem ser fortes de jeitos diferentes. Elas não precisam ser fortes só por dar chutes e pontapés. Mas para mim a força da Katniss não está na habilidade que ela tem em manejar o arco, mas sim em como ela abre mão de tudo em nome da irmã. Também gosto como suas formas de demonstrar amor e preocupação são diferentes do que a gente espera de uma mulher normalmente. Cada um demonstra de um jeito, pessoas são diferentes. Mulheres não precisam habitar caixinhas.
Mareska: Sem nem pensar duas vezes, foi a Bruxa Má do Oeste, graças ao escritor Gregory Maguire com a série de livros Wicked. Ele pegou uma das vilãs mais famosas, lhe deu nome e sobrenome e uma personalidade que vai muito além do apenas ser a malvada que quer matar Dorothy. Ele deu uma profundidade e ambiguidade incríveis à personagem, numa espécie de “redenção da vilã”, mas bem entre aspas: nem vilã, nem mocinha, a bruxa de Gregory Maguire é uma mulher ambigua que passou a vida fazendo suas escolhas e vivendo com as consequências delas. Aliás, se pensar bem, a própria bruxa de L. Frank Baum tinha lá seus motivos pra querer ver Dorothy morta, afinal, a menina estacionou UMA CASA na cabeça da irmã da bruxa e ainda roubou os sapatos da morta. Motivos bem válidos pra querer a cabeça de Dorothy.
Denise: É difícil demais escolher, mas entre a Princesa Leia, Éowyn, de Senhor dos Anéis, e Rose Hathaway, vou citar a Rose com maior profundidade. A Rose, que, como diz o ditado, “chegou chegando” desde a primeira linha. Com sua atitude convencida, maravilhosamente poderosa, com sua coragem para chutar traseiros daqueles que julgar merecerem o chute, a melhor amiga protetora, a garota apaixonada e sonhadora, a guardiã cheia de força e determinação. Logo no começo de Vampire Academy eu já sabia que desenvolveria uma profunda relação de amor pela Rose, e não deu outra! A cada cena, a cada decisão – apesar de algumas parecerem arriscadas e sem sentido – a cada luta e prova de que a coragem por aqueles que ela amava guiavam suas atitudes, eu queria ser igual ela. Invejei a Richelle por ter criado a Rose, por ter dado tanta vida e energia e paixão a uma protagonista tão marcante quanto aquela dhampir. Então foi Rose a personagem que mais me despertou pra isso – apesar de Leia ser meu exemplo de “kick-ass” desde pequena <3
Tammy: Talvez eu surpreenda com minha citação, mas curiosamente estou lendo A Passarinha, da Editora Valentina. Uma menina de dez anos, autista, conta sobre a vida depois da morte do irmão em um tiroteio escolar. Ele a ajudava a entender a vida e agora ela só tem o pai, ainda submerso no falecimento do filho. O livro é comovente e a personagem tem pensamentos únicos. Confesso, o livro me pegou de surpresa. Eu não espera tantas emoções nas palavras de uma menina tão nova. Todo mundo deveria ler esse livro! E a menina, claro, pela Síndrome Asperger, sofre com o mundo que não consegue entendê-la. Ao mesmo tempo ela parece dar respostas para o mundo melhores que as nossas. Esse livro, escrito por Kathryn Erskine, é emocionante por não ser óbvio. Impressiona por ser simples e ao mesmo tempo cheio de surpresas. E, com certeza, ela é mais do que pensam dela, diz mais ao mundo do que uma personagem óbvia.
Renata: Vou citar três livros que tem personagens femininas que me marcaram: CISNES SELVAGENS – Jung Chang; a série PRINCESA – Jean P. Sasson; e A MENINA QUE ROUBAVA LIVROS – Markus Zusak. No de Jung, ela descreve três gerações incríveis de mulheres. Em três épocas diferentes. Percebe-se o que cada uma fez em termos de vida e posição feminista. É um livro inesquecível. Muito forte nessa evolução das mulheres. E nos traz ao presente desse tema. Princesa é uma denúncia de uma mulher. Só por aí, ele é marcante. Conta a história de vida da Princesa Saudita Sultana que questiona e não tolera o universo machista do mundo árabe. Assim como no Cisnes Selvagens de Jung, choca pela forma brutal que as mulheres são vistas e tratadas. Já na ficção, Liesel de Markus Zusak é uma garota que tinha tudo para ser frágil e se desmontar no contexto de guerra e morte, mas é determinada. Cria um motivo, roubar livros, para crescer e evoluir. Segue lutando, inclusive, com a morte. Acho que essa nova realidade transparece o que estamos vivendo. A caricatura de personagens femininas mudou! As biografias mudaram, as ficções devem mudar junto! Afinal, em parte retratam o coletivo. Acredito que quando um escritor cria uma personagem com elementos que retratam a mulher com perfil do novo feminismo, está fomentando o início de uma análise da realidade. Se o leitor for mulher, reforça ideais de afirmação de suas características. Se for homem, cria a oportunidade de amadurecimento. É isso que Chimamanda Ngozi Adichie disse: “Sejamos todos feministas.”
Yasmin: Eu sempre digo que todos os personagens são os meus filhos. E minhas garotas são minhas rainhas e princesas! Mas as duas que mais me marcaram em SSD foram Julieta e Rhiannon. Julieta é a protagonista, tem apenas quinze anos, várias dúvidas sobre a vida e a própria sina, mas, apesar da falta de paciência e medo, ela segue em frente. Eu a criei e, no final das contas, acabei criando um elo com a personagem de tal forma que me emociono: ela é uma garota desafiando o próprio destino e questionando assuntos que as pessoas na época teriam medo de bater de frente. Quanto a Rhiannon, ela foi forçada a crescer rápido: fatos terríveis envolveram sua adolescência e ela teve que se portar como representante do clã e mãe do irmão mais novo. Sem contar ser subordinada do pai. Acho que ela representa, pelo menos um pouco, as jovens mulheres que talvez nem atingiram a fase adulta de fato, que têm que lidar com responsabilidades com bravura, apesar de se sentirem despreparadas ou acuadas. Acho que expor uma personagem feminina considerada forte em algum meio de arte é isso: mostrar que apesar de termos um lado tão sensível e até místico, nós temos tanta valentia e força quanto qualquer marmanjo barbado por aí! (risos)
Vemos tantos filmes de super heróis todos os anos e quantos são protagonizados por uma mulher? Só esse ano foi anunciado que a DC produzirá um filme sobre a Mulher Maravilha. Qual o impacto disso na indústria cinematográfica? Como os fãs reagem a isso?
Yasmin: Acho que cada um tem uma reação. Às vezes, vejo alguns comentando sobre a beleza estética da atriz e/ou personagem mais do que qualquer outro ponto. Mas acho que isso faz parte: há personagens que nos apegamos tanto que, quando os vemos nas telonas, desejamos do fundo da alma que sejam como imaginávamos! E as heroínas não poderiam ser diferentes. Particularmente, eu torço que ela tenha uma personalidade própria: não seja uma Mary Sue deslavada, senão eu choro. (risos) Ainda mais se for a Mulher Maravilha, no caso.
Tammy: Acho essa separação um pouco perigosa, como se isso fosse uma necessidade. Vejo como inspirações de escritores, criadores e não uma satisfação do mercado. Não fico dividindo a literatura/filmes em personagens masculinos e femininos, mas em filmes bons e ruins. Sei que isso acontece, mas já vi filme com protagonista homem em que me interessei mais pela personagem feminina coadjuvante. Quantos filmes de histórias de amor são protagonizados por homens? Meus livros são sobre garotas, mas tenho personagens masculinos importantes. Muitas garotas me escreveram se dizendo apaixonadas pelo Doutor Marcelo de Claro Que Te Amo! Eu gosto de ver bons filmes. A indústria pode investir mais em personagens masculinos, mas eu, por exemplo, escrevo na voz de personagens femininas por vontade. Como fã de cinema, eu quero assistir o que me comove e não por sexo feminino ou masculino. E que venham mais filmes com mulheres heroínas e mais filmes românticos com homens!
Renata: Essa indústria está totalmente permeada por chefes homens que enxergam somente o sexo masculino como heróis. Mulher? Só se for heroína de filhos, casa e marido. Eles olham torto a ameaça que sofrem das figuras femininas que assombram seus cargos. Então, por que dar o braço a torcer e dizer que há mulheres poderosas? Ou pior, como elas terão poderes se não é de força? Terão que assumir que o poder delas está na inteligência, criatividade e determinação? Eles ainda vivem o estereótipo feminino antigo, pois é mais confortável. Há algumas presenças de heroínas, mas sempre como coadjuvantes: como a Jean Grey e a Tempestade dos X-man – mas elas não são o Professor Xavier e nem o Wolverine. Se começar a procurar, tem sim heroínas. Mas geralmente ainda estão a sombra de algum herói. Ou ainda, são aquele modelo que já comentei: sex, linda, corpão e coisa e tal. Vou falar! Eu amo HQ, quadrinhos, games, filmes e todo o resto que Chuck Palaniuk descreveu como coisa de homem. Se é assim, sou homem! Isso é coisa de qualquer um. Como disse, não gosto de rótulos. Mas com certeza, esse universo todo é bem machista ainda. Como fã disso tudo, tento olhar apenas como diversão. Sem levar em conta a mensagem subliminar implícita (e explícita) no material.
Anne: Acho que isso é um sinal de que estamos conseguindo espalhar nossa mensagem, conquistar nosso espaço. Talvez o impacto não seja tão grande para o público porque muitos ainda não se dão conta da importância disso.
Denise: Maior decepção da minha vida ainda não terem anunciado um filme da Mulher Gavião, mas olha ai, a Diana finalmente chegou para sambar! E a Marvel acaba de anunciar o filme da Capitã Marvel, o que é outro ponto positivo para nós. Já tá mais do que na hora de abrir espaço para super-heroínas protagonizarem suas próprias histórias; não só como a coadjuvante fodona que ajuda o super-herói a salvar o dia, mas aquela que salva. O bacana desses anúncios é que, até agora, eu só vi respostas positivas ao filme da Mulher Maravilha ou da Capitã Marvel. São heroínAs, donas do próprio filme, liderando o título e a porradaria toda contra o mal, e vai ser lindo vê-las chutando traseiros. E eu estou esperando ansiosamente pela Shayera ganhando o próprio filme.
Iris: A Marvel também acaba de anunciar um filme da Capitã Marvel, isso é bem legal. É meio triste ver que o mercado ainda não está preparado para receber mulheres heroínas como protagonistas. Se estivesse, as produtoras já teriam investido nisso antes. Mas gosto de ver que aos poucos o mercado está se abrindo e ainda espero um filme da Viúva Negra! Foi legal ver a receptividade de todo mundo à essas notícias, espero que invistam mais.
Mareska: … não consigo lembrar de nenhum a não ser Elektra e aquele da mulher-gato com a Halle Berry? Que foram fracassos de bilheteria e atribuíram isso ao fato de terem protagonistas mulheres, e não ao fato de serem filmes ruins (nunca vi ninguém dizer que Demolidor foi ruim porque o Ben Affleck é homem, o mais próximo disso foi terem acusado ele de ser… o Ben Affleck). O impacto é grande exatamente por causa dessa coisa de ainda acharem que “super heroína não vende”, então todo mundo quer ver no que vai dar: alguns torcendo pra dar certo, alguns (imbecis) torcendo pra dar errado.
Bárbara: A Marvel também anunciou o filme da Capitã Marvel e com isso duas das minhas super-heroínas favoritas vão para o cinema! Eu nem consigo achar palavras para descrever como acho isso maravilhoso, mas a pergunta aqui não é sobre isso. Então vamos para a minha dissertação: A questão toda é que quando um filme de super-heroína é ruim e fracassa na bilheteria, a causa direta é ter uma protagonista mulher. É uma regra de hollywood: Filme de ação protagonizado por mulher não dá lucro, não é rentável. Por outro lado, se um filme com um protagonista masculino fracassa, os motivos são desde o roteiro ruim, passando por direção e edição ruins ou outros aspectos técnicos. Ninguém diz que o filme foi ruim por causa do gênero do personagem principal. Tem um levantamento muito interessante mostrando que filmes protagonizados por mulher normalmente dão um lucro maior que aqueles protagonizados por homens, mas aparentemente executivos barbados tem algo contra dados se envolve os dois cromossomos x como protagonistas. Isso felizmente está mudando e nós temos muito a agradecer às adaptações de livros YA. Crepúsculo certamente foi um avanço nesse sentido, mas sinto que Jogos Vorazes teve um impacto muito maior por ser um filme de ficção científica protagonizado por uma adolescente que foi estouro de bilheteria. Os barbudos donos de estúdios perceberam que tem um grande público carente de histórias boas protagonizadas por mulheres e estão dando mais chances para filmes nesse sentido, além de permitir roteiros com mulheres com nuances diferentes daquela velha fórmula de Mulher Forte. Eu estou bem otimista e louca para ver Diana e Carol sambando na cara da sociedade no cinema.
O que nos leva ao nosso próximo ponto: por que quando a protagonista é uma menina (principalmente nessas distopias) os relacionamentos românticos delas sempre parecem mais importantes do que quando o heroi é um cara? Sem contar o hate que muita personagem feminina recebe por atos que não causariam o mesmo impacto fosse um personagem masculino. Tomando como exemplo Brenda na trilogia do Maze Runner e Malia em Teen Wolf, ambas odiadas profundamente por “atrapalharem OTPs”, nós não vemos a mesma reação com Aris e Aiden. Por que vocês acham que esse tipo de comoção é tão comum?
Renata: Para a questão de relacionamentos serem aparentemente mais importantes para garotas, acredito que seja por puro preconceito derivado do machismo enraizado ainda na cultura mundial. Em alguns países mais e em outros menos. A verdade é que quando pensamos em uma figura feminina ela vem com atributos diretos ligados a sentimentos como paixão, fidelidade, retidão. E quando a mocinha – seja na ficção ou na vida real – não é bem assim, já é julgada. Aquela velha máxima, a menina tem que ter namorado e casar para sempre, nunca nem imaginar trair. Agora o garoto deve curtir a vida e se – se for – casar, tudo bem dar escapadinhas. Digo isso e me incluo nesse bolo que acaba tendenciando na figura feminina politicamente correta. Pois, tem vezes que vou escrever e, acabo caindo nessa redundância de gêneros. E na vida real, me pego pensando em amigas que não casaram e não me assustando mais com a traição de algum conhecido homem. É triste, mas ainda temos sim muito machismo em nós, apesar de declarações fervorosas contrárias. Afinal “nossas ideias de gênero ainda deixam a desejar”. São atos bobos às vezes, como esse de criticar a mocinha do livro que trai ou tem triângulo amoroso ou que ainda atrapalha um lindo casal. Na questão da comoção… nós mulheres vibramos mesmo com um final amoroso feliz, pois é a nossa projeção que nos faz sentir assim. É o que queremos para nós. Algumas precisam de altas doses, outras menos. Conheço vários homens heteros que também se deixam sentir assim. E tenho diversos amigos homens homo que, é claro, tem maior facilidade de mostrar seus sentimentos. Isso porque o que determina se vamos curtir ou não romance, histórias de amor, ficar com ódio de destruidores de casais são nosso valores e os elementos culturais. Isso inclui o machismo.
E se comover com histórias que não são nossas é um processo de evolução do ser humano, já que nos colocamos no lugar do outro e sentimos o que essa outra pessoa está sentindo. É normal, independente de gênero.
Larissa: Acho que se tornou comum porque o romance é um gênero que a gente associa automaticamente ao público feminino. Somos vistas como o sexo frágil e emocional, então parece quase um crime que um envolvimento romântico não tenha tanta importância pro contexto. O irônico disso tudo é que em muitos casos ele realmente não tem, mas o próprio público cria uma importância maior, por hábito. Não tem tanto a ver com o tratamento dado por quem escreve, mas com a receptividade de quem está lendo ou assistindo. Os personagens homens existem independente de fazerem ou não par com outra personagem, enquanto as mulheres parecem só ter uma importância fundamental quando se envolvem romanticamente com alguém. Isso polariza os sentimentos, é claro. Se você já deu o papel de mocinha pra uma determinada personagem, qualquer outra que surja depois vai ser odiada, independente da sua participação ter ou não a ver com um romance em potencial.
Mareska: Em parte é por causa da mania das pessoas de acharem que uma personagem feminina protagonista PRECISA ter um interesse romântico pra ter motivação real pra fazer qualquer coisa: ou pra lutar por ele, ou pra ele servir como uma espécie de cheerleader que vai dar à protagonista a força que ela precisa pra fazer seja lá o que ela tem que fazer. Quanto ao hate, personagens femininas são muito mais cobradas e julgadas do que personagens masculinos e o motivo é machismo (puro e simples dos homens, internalizado das mulheres). Mas tem que se levar em consideração um pouco do fator delusional de parte do fandom.
Tammy: Talvez porque o livro com protagonista homem tenha um foco maior na aventura. Pode ser que a distopia com a personagem feminina tenha mais abertura para o romance. Eu nunca escrevi uma distopia, não tenho vontade até o dia de hoje, mas acho que caso escrevesse minha personagem esqueceria a trama por uma paixão, não daria muito certo.
Denise: Às pessoas que odeiam a Brenda: eu gostaria que vocês tropeçassem numa casca de banana. O overreacting é realmente muito maior quando tem uma garota atrapalhando o ship principal – tanto que, quando é o contrário, dá pra notar que rola a indecisão de “ai, com quem ela vai ficar?”. THG é um exemplo disso, com o triângulo amoroso (até porque, oi, a Suzanne nunca escreveu um livro todo focado em política, tirania e rebelião pra ver briguinhas acontecendo por causa dos pares românticos da Katniss). Acho que a comoção a respeito dos relacionamentos amorosos quando a protagonista é uma garota é maior porque, socialmente, as mulheres já são condicionadas a serem rivais umas das outras. Isso faz com que a literatura retrate essa rivalidade; “inveja” da amiga, raiva porque tá atrapalhando o ship, detalhes que estão na ficção porque existem na realidade.
Anne: Posso falar o quanto eu odeio essa maneira de retratar, focando no romance? Oh meu Deus, eu odeio muito isso! Acho que é por causa da imagem que carregamos de sermos mais emocionais e talzs (hm, interessante como se conectou com a resposta lá da primeira), mas isso não justifica esse absurdo. Afinal, em considerável parte das vezes, a garota tem um mundo a salvar, então claro que a maior preocupação da vida dela não vai ser um cara! Ridículo se fosse, né? E não, não quero dizer que elas não devem ter um par. Minhas meninas tem os seus, são muito felizes com eles, mas definitivamente o centro da vida delas não é o shipp. Mas voltando a pergunta… Talvez porque a mulher carrega um estereótipo de “a outra”. Em quantas ficções vemos uma mulher sendo amante, e em quantas vemos o homem?
Aposto que a primeira ganha de lavada. É como se já carregássemos na mente a imagem de que, quando aparece uma garota nova, o casal vai ter problema (e, em si, isso é uma crítica enorme aos rapazes, como se eles não pudessem ser leais a quem amam)
Larissa: Acho que porque, querendo ou não, todo mundo se acostuma com a ideia do protagonista masculino ser “o cara almejado entre as mulheres” e todas têm que sofrer por isso, mas quando é uma mulher aí ela está sendo “fácil” ou qualquer outro termo pejorativo. Acho que as pessoas deveriam admitir para si mesmas que a arte imita a vida e vice-versa: se em nossa dimensão chamada de “mundo real” há tanto garotas quanto garotos atrapalhando nossos supostos OTPs, porque seria diferente num livro ou filme? Eu detesto triângulo amoroso de qualquer forma, seja qual for a formação! (risos)
Bárbara: Isso é um problema sério, sabe. Eu considero 1984 um romance, uma história de amor, primeiramente, mas ninguém foca nisso porque o protagonista é o Winston, um cara. Tem um viés claro, porque as pessoas mencionam o romance em Jogos Vorazes constantemente e, para mim, ele é tratado de forma mais sutil e mais suave do que em 1984. Mas como a Katniss é uma adolescente num livro para adolescentes, as pessoas dão um foque muito maior para isso. Acho que isso vem mais da dicotomia de livro escrito por mulher = ROMANCE AMOR OHH RELACIONAMENTOS, livro escrito por homem = LIVRO SÉRIO, OLHA SÓ, QUE ROMANCE O QUE SÃO SEUS OLHOS. É algo que a gente tem internalizado e vem dos papeis de gênero. Então tem gente que pega um livro escrito por mulher e já vai pensando “vai ser mais sentimental porque mulheres são assim”, sendo que isso tudo é construção cultural. (Tem mil livros sobre isso. Sobre construção cultural do papel dos gêneros, recomendo procurar algo da Margaret Mead. Sobre mulheres na literatura, Virginia Wolf) Sobre o hate, eu não tenho opinião formada e nunca pensei muito sobre o assunto. Acho que tem a ver com essa cultura que a gente tem de ver garotas como rivais, sempre, o que não acontece com dois garotos. Trabalhando com o clichê aqui, um triângulo amoroso h-m-h, por exemplo, apresenta duas opções de caras para escolher e eles eventualmente acabam se unindo para proteger de alguma forma a mulher. Além disso, o ódio é direcionado à menina, que não consegue se decidir entre um e outro. Já um m-h-m, as duas meninas competem e fazem tudo para ficar com o cara e nunca, em nenhum momento, superam as diferenças para colocar o bem do cara em primeiro lugar, por exemplo. Então os fãs acabam se identificando com uma e escolhendo a outra, e o cara nunca é penalizado pela sua indecisão.
Iris: Bom, eu só vi o filme de Maze Runner e de Teen Wolf só conheço o que vi na minha timeline do Tumblr, então não vou comentar esses casos específicos, mas no geral. Tem uma palestra muito boa da Chimamanda – que você pode baixar em e-book de graça na Amazon – chamada “Sejamos todos feministas”. É a palestra da música da Beyoncé. Nela ela diz que nós mulheres somos educadas para tratar as outras mulheres como potenciais inimigas por causa de homens. Está aí, nas músicas que a gente canta dançando na pista como Beijinho no Ombro ou Show das Poderosas. Está nos filmes que a gente vê, nos livros, nas séries. Nas nossas conversas do dia-a-dia. Chamar um homem de “cafajeste” não tem o mesmo peso de chamar uma mulher de “piranha”. A gente chama outras mulheres assim quando elas estão olhando pro nosso namorado, ficante, interesse amoroso. Então é quase natural esse discurso ser transferido pros personagens de ficção. É triste e a gente tem que se policiar no dia a dia para que isso não aconteça. Não dá pra ficar reproduzindo discurso opressor.
Quando você publica um texto online e há romance, é preciso sempre tomar muito cuidado ao adicionar uma personagem feminina justamente porque todo mundo fica achando que ela vai interferir no precioso romance. Quando se recebe um feedback como esse (“MDS, FULANA, ESPERO QUE ELA NÃO ATRAPALHE CICLANO COM BELTRANA! D;”), dá a impressão de que é muito difícil desvincular a visão “homewrecker” que as mulheres têm na ficção. Como você, sendo profissional do entretenimento, tenta mudar esse paradigma?
Denise: Para começar, quem atrapalha o OTP nos meus livros é sempre o cara. E eu deixo claro, por escrever pelo ponto de vista das protagonistas, que a decisão tomada por ela para o ship virar canon é por ele ser a melhor opção pra ela. Eu não quero meus leitores brigando para ver qual ship vira canon, eu quero vê-los torcendo pela felicidade da mocinha, seja ela qual for. Crio e desenvolvo os relacionamentos baseados no que ajuda mais a personagem a crescer, no ship que deixa ela mais forte, mais romântica, mais decidida e poderosa. Não que o outro ship seja ruim – pelo menos nos livros que eu escrevi até agora – mas, dado o desenvolvimento da protagonista, o OTP vai existir porque ela decidiu e deixou que ele existisse. Eu acho bem ruim quando, ao invés de focar no crescimento da personalidade dos personagens, em como ela evoluiu desde a primeira aparição, o foco de alguns shippers fica no romance e nos conflitos envolvendo ele – como, por exemplo, alguém aparecendo para “atrapalhar”. Em ficções, pelo menos, o romance deveria ser visto como uma parte importante da trama, não como o centro dela.
Bárbara: Eu ia respondendo isso lá em cima, mas sorte minha ter lido logo essa pergunta! Eu acho que o papel de quem cria histórias é subverter a todo o instante as ideias preconcebidas que as pessoas tem. Gosto de pensar que você não tem que fugir do clichê e sim transformá-lo em algo novo, quebrar as expectativas do leitor e fazê-lo questionar sobre as outras obras que ele leu.
Mareska: Nas resenhas, tento sempre dar espaço maior às personagens femininas exatamente pra mostrar que as relações entre elas e delas com a história não se resume a “quem vai levar o macho pra casa”. Às vezes são detalhes pequenos que acabam fazendo toda a diferença na maneira como você encara a personagem, mas estamos tão acostumados a julgar logo de cara que esses detalhes passam despercebidos.
Yasmin: Aí está uma coisa que estou preparando para PdG: mostrar as faces das personagens carinhosamente ao leitor. Acho que as pessoas se assustam e temem pelo ship porque nessas horas parece que abriu um alçapão no meio do campo florido e “a outra” (ou talvez nem seja “a outra”) surgiu na cena. (risos) Apresentando melhor as personagens, seus gostos, suas personalidades e forma de interagir com os outros faz com que os leitores fiquem um pouco mais tranquilos. Acho que mesmo que ela supostamente atrapalhe o ship, não se torna uma coisa tão assustadora. Como eu disse anteriormente: a arte imita a vida. Acho que não é necessário tanto alvoroço por causa de um ship. Mas quanto ao enredo…
Anne: Não fazendo triângulos (nem qualquer polígono) amoroso. Acho que, no final das contas, essa imagem já ficou gravada em nós porque toda hora acontece. Toda hora mesmo. Claro que uma vez ou outra pode acontecer, mas já chegamos a um ponto de supersaturação. Me perdoe quem por acaso goste/escreva sobre, mas eu já peguei até fobia disso. Até porque, muitas vezes, quando tem, volta lá para aquela questão que comentei: Se torna o centro da história/da atenção dx personagem. Ridículo (de novo)
Renata: Primeiro, fujo dos estereótipos e das histórias clichês. Na vida real, o romance é apenas algo em meio a um dia cheio de atividades. Só gente que não tem o que fazer, sem objetivo, atitude e até um pouco fissurada demais, é que fica o dia todo pensando e fazendo algo por um romance. O narrador também tem que ser esperto bastante para não transparecer a sequência. Se um personagem feminino chega sem um propósito marcado, o leitor vai suspeitar dela e vai tramar hipóteses. Pronto, o autor entregou o jogo ou conduziu o leitor para o clichê. O escritor deve ter personagens mais densos, com intenções muito além do óbvio e da finalidade dele na trama para não deixar o texto superficial. Gosto de inserir subtextos, deixar a personalidade mais complexa e trabalhar o foco narrativo para evitar que aconteça. Isso tudo claro, falando de um público mais maduro. Quando escrevo mais infanto-juvenil tem que simplificar mesmo. Afinal eles não têm maturidade para discernir nesse nível.
Iris: É meio complexo. A gente nem percebe que adicionou “homewrecker” às nossas histórias até que alguém aponte isso. Essa mentalidade está tão entranhada na nossa cabeça que isso acaba acontecendo vez ou outra. O que eu tento fazer sempre é mostrar que homens e mulheres tem defeitos, erram em relacionamentos e são passíveis de críticas. Uma coisa que me preocupo muito é em criar amizades femininas fortes, onde haja companheirismo e não competição.
Tammy: Na verdade eu não publico histórias online. Os livros saem prontos, obras fechadas, mas o que posso dizer é que as opiniões dos leitores me importam. Muita opinião sobre um livro meu, ajuda na construção do outro. Tudo isso sem atrapalhar a originalidade da minha escrita e a função que eu quero para a minha literatura. O que me dizem anoto para crescer como profissional, porque não me sinto pronta e quero aprender ainda mais sobre a arte de escrever. Eu amo escutar os leitores. Tudo que eu tenho hoje, eu devo a cada um que consome o meu trabalho.
Larissa: Eu acho que é o tipo de coisa que está diretamente ligada ao modo como nós enxergamos as mulheres, e ao modo como fomos criados, e infelizmente não é algo que podemos mudar com facilidade. Conectando com a pergunta anterior, estamos muito acostumados – eu diria até que condicionados – a associar o sexo feminino com romance, e por isso dificilmente desvinculamos a figura feminina do seu papel de futura mãe de família; no fundo, é isso que a gente faz toda vez que cria um ship. Você quer que eles se casem, tenham filhos, envelheçam juntos. E acaba esquecendo que, pros personagens, assim como pra gente, na vida real, existe vida além de um envolvimento romântico. Então, num primeiro plano, é isso que eu sempre procuro fazer: fortalecer as minhas personagens fora do romance, como pessoas independentes, fortes à sua maneira. Mas eu acho errado pra mim, bem como para a história, fugir de um potencial romance ou de uma personagem que possa ser interessante pro contexto só em função do julgamento dos leitores. Porque esse julgamento vai existir independente da escolha que eu faça, e porque é importante pra mim fazer uso de todas as possibilidades. Eu posso trazer pra história uma personagem secundária sensacional que causa ciúmes na protagonista, e mesmo assim o público escolher odiá-la pelo seu possível envolvimento amoroso do que tentar amá-la pelo que ela é. Infelizmente, é uma escolha na qual eu não posso opinar. Eu posso fornecer as informações, mas o resto é com quem está lendo. Vai da cabeça de cada um enxergar de formas diferentes. Existe um limite entre o que eu gostaria de alcançar e o que eu efetivamente consigo.
Fim da parte 1
Não se esqueçam de voltar amanhã para conferir a parte final dessa conversa!
2 Comments
Who's thanny? » Arquivo Semana Coisa de Mulherzinha
02/11/2014 at 7:25 pm[…] de mulherzinha com autoras e blogueiras: feminismo na cultura pop | parte 1 | parte […]
Renan Soares
08/06/2018 at 5:44 pmMuito bom acompanhar relato de outras mulheres em relação a situações comparativas e vivenciadas com homens, de fato os movimentos são muito importantes para a conquista cada vez maior da igualdade de direitos.